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- 27/07/23

Para mercado, ações de Haddad para viabilizar orçamento são precipitadas e podem elevar impostos

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, indica que vai apresentar em agosto, junto ao Orçamento, parte das medidas que compõem a reforma do Imposto de Renda (IR). Atores do mercado consultados pela CNN veem riscos neste movimento.

Haddad já sinalizou que vai enviar ao Congresso propostas para ampliar a taxação dos fundos exclusivos de investimentos, os chamados fundos de super-ricos, e a revisão dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), um tipo de benefício tributário concedido hoje à distribuição dos lucros das empresas.

Além disso, o governo deve transformar em projeto de lei a proposta para taxar investimentos no exterior, como em “offshores” e “trusts”. Atualmente a norma tramita como medida provisória (MP), mas o governo já espera que a redação caduque.

Desde que o ministro anunciou que planejava atrelar o Orçamento à aprovação das medidas, parlamentares o aconselham a adiar o debate sobre a taxação de renda para depois da aprovação da reforma do consumo no Senado, que deve acontecer em outubro.

Na segunda-feira (24), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), alertou publicamente que insistir agora nas medidas da tributação dos super-ricos cria riscos para o avanço da reforma tributária no Senado.

As medidas são vistas pelo ministro e por parte da Fazenda como um caminho para atingir as metas do novo marco fiscal. Para 2024, a redação prevê zerar o déficit primário.

Reforma pela metade e aumento de carga

O economista-chefe da gestora Ryo Asset, Gabriel Leal de Barros, aponta que pesa o fato de o governo querer adiantar essas alterações e fazê-las em uma etapa separada do restante da reforma tributária sobre a renda.

Esta deveria ser uma segunda etapa da reforma tributária, planejada para ser apresentada e discutida mais à frente, depois da aprovação da reforma tributária que já está no Congresso e que mexe nos impostos do consumo, segundo o economista.

Além do JCP e da tributação dos fundos dos super-ricos, outros temas que devem ser tratados nesta segunda etapa da reforma tributária são o imposto de renda das empresas e das pessoas e a tributação de dividendos.

“O JCP se comunica com os dividendos e com a alíquota do IRPJ [Imposto de Renda da Pessoa Jurídica]”, disse ele, lembrando que a promessa é que, nesta segunda etapa, os dividendos passem a ser tributados enquanto o IRPJ tenha alguma redução.

Com esse rebalanceamento, a ideia que os impostos totais pagos pelas empresas sobre seus lucros, ao final, fiquem iguais.

“Mas, se o governo só tira o JCP agora, sem que as empresas saibam quais reduções de imposto poderão ter depois, vamos ter aumento de carga tributária. O governo vai aumentar a carga antes para dizer, depois, o que poderá reduzir.”

Manobra para cumprir meta fiscal

Para Barros, a pressa do governo em adiantar essas mudanças tributárias para a lei orçamentária do ano que vem é movida, basicamente, pela necessidade de entregar a meta fiscal prometida para 2024, que é de zerar o déficit.

“Isso mostra que Haddad não tem tanta confiança nas medidas de arrecadação com que estava contando”, disse, mencionando mudanças importantes, mas ainda atrasadas, como as mudanças nos votos do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), que poderão favorecer o governo nas disputas com as empresas sobre impostos.

“Há pouco tempo e o governo sabe disso”, diz o economista-chefe e sócio da corretora Warren Rena, Felipe Salto.

“Para que um Orçamento enviado ao Congresso em agosto, prazo constitucional, seja crível, não poderá vir com uma meta fiscal zerada sem mostrar os instrumentos e mecanismos para isso. Daí porque essa urgência, mesmo com a PEC 45 [da reforma tributária sobre o consumo] ainda não finalizada.”

Para Salto, esta intenção de Haddad está em linha com o que era esperado.

Segundo o especialista, o ajuste fiscal do atual governo tem “base forte” na recuperação de receitas.

“O governo está, neste momento, focado em buscar arrecadação suficiente para cumprir também a meta de resultado primário. Será muito difícil esse feito no ano que vem”, afirma ele.

O economista avalia ainda que, se as medidas propostas avançarem rápido, poderão melhorar as projeções do PIB.

“Essa agenda será agora central, enquanto se encaminha a etapa da reforma tributária do consumo no Senado, que, aliás, não será nada fácil”, complementa.

Salto destaca que o governo tem corrido contra o tempo para debater as medidas antes de enviar o Orçamento ao Congresso.

“A Lei Orçamentária Anual bate à porta. A Lei de Diretrizes Orçamentárias nem foi aprovada ainda. Já estourou prazo, aliás”, diz.

“Como não há programa para cortar gastos, resta à receita fazer o seu papel. É uma espécie de caça ao tesouro, que, aliás, em boa medida é positiva, porque o Brasil carrega quase meio trilhão de reais em renúncias tributárias”, avalia.

Para ele, a mudança dependerá de ações concretas da Receita Federal para render frutos, na subvenção baseada no ICMS.

“Todas as outras têm potencial arrecadatório relevante, mas nunca se deve ignorar os efeitos sobre a atividade e sobre os setores penalizados. Não existe almoço grátis”, conclui.

Fuga

Rogerio Fedele, advogado sênior da área de Wealth Planning & Tax do escritório Abe Advogados, explica que essa mudança pode gerar “aversão” no mercado financeiro, o que pode acarretar em fuga de capitais do Brasil para o exterior.

“Com a tributação periódica, o fundo terá que se capitalizar ou realizar parte do investimento para pagamento do imposto, o que pode tornar cara ou ineficiente a estrutura de fundo. Assim, é possível que muitos investidores desfaçam a estrutura e eventualmente aloquem os recursos no exterior, o que pode prejudicar a economia brasileira”.

Segundo levantamento da Trademap, os fundos de super-ricos registraram resgates de R$ 27 bilhões entre os dias 1º de abril e 18 de julho deste ano. A intensificação dos resgates aconteceu após o governo anunciar que estudava a mudança na tributação.

Ativos e rendimento na mira

Os chamados fundos de super-ricos se caracterizam por suas cotas pertencerem a um único cotista. Com isso, a alocação de recursos é realizada por um gestor profissional de maneira “personalizada”.

Atualmente, esses fundo são taxados apenas no resgate dos rendimentos. A ideia do governo é estabelecer uma tributação semestral — o chamado “come-cotas” —, que ocorre no último dia de maio e no último de novembro.

O JCP é uma forma de distribuição dos lucros de uma empresa de capital aberto aos seus acionistas. Neste tipo de operação, a empresa não paga impostos, mas o investidor paga 15% de IR.

Os repasses de juros aos investidores são considerados como despesas e descontados do lucro.

O mecanismo foi criado para atrair investidores ao mercado de ações e facilitar autofinanciamento com recursos dos sócios.

Ao comentar o mecanismo, Haddad disse que empresas estão zerando os lucros artificialmente para transformá-los em JCP.

As taxações de rendimentos no exterior já tramitam no texto da MP 1.171. O texto deve caducar, visto que sequer foi instalada uma Comissão Mista para analisá-lo. As disputas entre as casas legislativas vem atrasando este tipo de tramitação no Congresso.

A proposta mudava regras para a tributação de rendimentos recebidos no exterior por meio de aplicações financeiras, entidades controladas, além dos chamados “trusts” – fundos usados para administrar quantias de terceiros. Esse último tipo de aplicação é comumente feita em paraísos fiscais.

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