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- 21/11/23

Dívidas prescritas: o embate legal e econômico na cobrança extrajudicial

A viabilidade de cobrança extrajudicial e judicial de dívida prescrita tem retomado a cena nos últimos dias, criando um debate sobre as implicações econômicas dessa controvérsia.

O Anuário da Justiça de São Paulo 2022 identificou significativas divergências entre as Subseções de Direito Privado 2 e 3 do TJSP em ações relacionadas à cobrança extrajudicial de dívidas prescritas e ao cadastro do devedor no Serasa Limpa Nome, levantando questões cruciais sobre como as decisões judiciais podem afetar a economia e o setor financeiro.

O posicionamento mais conservador sustenta que, uma vez configurada a prescrição, resta caracterizada a inexigibilidade do débito, seja por meio judicial ou extrajudicial, assim como a imposição de obrigação de não fazer ao credor, que deve se abster de promover cobranças referentes ao débito prescrito, inclusive administrativamente.

Tal posicionamento foi reforçado pelo acórdão proferido pela 21ª Câmara de Direito Privado do TJSP [1], que, suscitando a aplicabilidade do artigo 189 do Código Civil, concluiu que “a ocorrência da prescrição obsta não só o ajuizamento de ação específica para a sua cobrança, como também a sua exigência pela via extrajudicial”. Há, também, acórdãos reconhecendo a existência de dano moral em casos análogos, respaldando-se no enunciado nº 11 do TJSP.

Em sentido contrário, algumas decisões do TJSP adotam entendimento mais flexível, defendendo que a prescrição não torna a dívida inexistente, apenas limita o direito de ação do credor em exigir judicialmente o pagamento do débito, permanecendo hígida a possibilidade de cobrança na esfera administrativa.

Sobre os reflexos da cobrança extrajudicial, a maioria da 13ª Câmara de Direito Privado entende que o Serasa Limpa Nome não pode ser equiparado a cadastro de inadimplentes, já que não há publicidade das informações e, consequentemente, inexiste dano moral, sendo apenas um meio de incentivar a negociação da dívida diretamente entre as partes.

Os defensores dessa corrente alegam a possibilidade de manutenção do cadastro da dívida prescrita nas plataformas de proteção e negociação de crédito, em razão do artigo 14 da Lei nº 12.414/11, que admite que as informações acerca de inadimplemento poderão constar nos bancos de dados por até 15 anos.

Além disso, conforme entendimento firmado pela 11ª Câmara de Direito Privado do TJSP, o enunciado em referência é inócuo, já que “sem lei que preveja como ilícita a cobrança extrajudicial de dívida prescrita, de forma pura e simples, isto é, sem abuso, não há que se falar em ato ilícito a sua ocorrência”.

Diante da controvérsia existente, em sessão virtual das Turmas Especiais de Direito Privado do TJSP foi proferida decisão no IRDR nº 2026575-11.2023.8.26.0000, determinando a suspensão dos processos que envolvam a inscrição do nome de devedores na plataforma “Serasa Limpa Nome” e outras similares para cobrança de dívida prescrita.

Identificando que há precedentes que seguem raciocínios distintos, o relator do IRDR compreendeu que existe risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, que não foi solucionado com o enunciado 11 do TJSP.

Em linha com o posicionamento mais conservador do TJSP, a 3ª Turma do STJ firmou entendimento no sentido de que a prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial, quanto a cobrança extrajudicial.

Para a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, a cobrança extrajudicial do débito prescrito implica na manutenção da pretensão executiva, mesmo que fora da esfera judicial:

“Se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada em razão da prescrição, não será mais possível exigir o referido comportamento do devedor. Ou seja, não será mais possível cobrar a dívida.”

A cobrança de dívida prescrita na esfera extrajudicial, assim como a possibilidade de manutenção do nome dos devedores nas plataformas de negociação, tem sido amplamente discutida no país, resultando em IRDR’s em diversos estados. A maioria dos tribunais concorda que o convite a negociar não se trata de cobrança vexatória. Inclusive, já foi proferida decisão favorável no IRDR do TJRS, reconhecendo a legalidade de inclusão de dívidas prescritas no Serasa Limpa Nome, sem que isso gere direito a indenização.

Ambos os posicionamentos trazem prós e contras.

Quanto ao risco financeiro, essa decisão traz maior segurança para os devedores, estabelecendo um prazo determinado após o qual as dívidas prescritas não podem mais ser cobradas, nem mesmo por meios extrajudiciais, reduzindo o risco de perseguição indefinida dos devedores. Em contrapartida, os credores deverão observar os limites previstos no artigo 206 do Código Civil, fazendo com que se tornem mais cautelosos na concessão de crédito, já que enfrentarão limitações temporais mais rígidas para recuperar dívidas.

Já o cenário mais flexível aumenta as chances de recebimento da dívida pelo credor, na medida em que fica autorizada sua cobrança extrajudicial, mesmo após a ocorrência da prescrição. O devedor, por sua vez, poderá ser cobrado indefinidamente, desde que de forma não vexatória. Assim, no que diz respeito à concessão de crédito, a decisão pode incentivar a concessão de linhas de financiamento e empréstimos.

O IRDR do TJSP ainda não possui data para julgamento, mas deve estancar a discussão sobre a cobrança extrajudicial de dívida prescrita, uniformizando a jurisprudência do tribunal, evitando decisões conflitantes e assegurando a isonomia e segurança jurídica.

Prevalecendo a corrente mais conservadora, os credores – e fundos de direitos não padronizados – precisarão reavaliar suas abordagens. Com a impossibilidade de cobrar dívidas prescritas, direcionarão esforços para garantir que as dívidas não atinjam o estágio de prescrição, envolvendo estratégias mais proativas de cobrança e negociação, a fim de evitar a perda de créditos que se tornarão inexigíveis após a prescrição.

A decisão da 3ª Turma do STJ impacta o mercado financeiro ao delimitar o prazo para cobrança de dívidas prescritas, influenciando a gestão de risco, concessão de crédito e estratégias de cobrança adotadas pelas instituições financeiras e credores, equilibrando os interesses dos devedores e credores, promovendo um ambiente mais previsível e justo no mercado financeiro.

Veremos se esse mesmo raciocínio será seguido pela Corte bandeirante.

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